Noite de Cristal
(Kristallnacht)
Ao fim da tarde, quase noite
gosto de me despedir da Baía
Num espreguiçar lento de fogo
o sol desliza pela linha do horizonte e
mergulha tranquilo na Baía dos meus amores
Aquele fim de dia foi diferente
inesquecível
da Sinagoga de Colónia
o som da *Shôphar invade o Mundo
projecta-se ali, naquele fim de espaço
e grita, grita, grita...
1938
e a Noite de Cristal
e as Sinagogogas incendiadas
e conta, conta ao mundo
histórias de intolerância
histórias de morte
histórias de horror!
O som cola-se à pele, fico hirta, gelada
O som da agonia parece não ter fim.
A Baía abre-se lentamente
O som da Shôpar repete-se:
evoca almas
convoca homens, mulheres e crianças
que como rios avançam em busca da foz
Multidões de vidas interrompidas
emergem das águas
num bailado síncrono
sem dedos acusadores
avançam
e em uníssono sussurram humildemente:
Quantos mais terão que acabar como nós ?!
Cerra-se o silêncio
acende-se a noite
um pescador lança a rede
brilham mais estrelas no céu esta noite.
* trombeta feita de chifre
Isabel Simões
S.Martinho do Porto
Agosto de 2007